Desde de criança que ativo a minha imaginação através das artes plásticas para exteriorizar o meu Mundo Interior. Na adolescência era bastante tímida, refugiava-me no meu quarto para construir o meu castelo nas nuvens e para aliviar as minhas dores de crescimento. Como me doíam! Nesse momento, aprendi [depois de muito tempo confinada voluntariamente e com muito tédio] uma das coisas mais importantes de todas: que a criatividade pode criar novos mundos e ser uma das respostas mais luminosas nos momentos de solidão. Quase todos os momentos mais difíceis da minha vida descobriram na criatividade a resposta à mudança e ao empoderamento. Este momento atual não é exceção e o meu impulso é CRIAR. Criar novos espaços cheios de identidade que nos possa transformar os dias e energizar-nos. Criar novos hábitos, rotinas e com elas novas relações espaciais. O desafio do momento é: Recriarmo-nos através da nossa Casa. Ressignificarmos o nosso espaço intimo. Desenharmos novas relações entre o espaço interior e exterior. Marcar a diferença ao ajudar quem não tem casa

Este Confinamento pôs-nos “ mano a mano” com a nossa própria casa. O nosso corpo convive com o nosso refúgio 24 horas por dia. Muitas estão a ser as reflexões sobre o nosso habitat, sobre as novas necessidades de espaço que temos, sobre as possíveis adaptações de usos que podemos fazer, e há uma tomada de consciência de que a  nossa casa é a nossa máxima zona de conforto. Um corpo que nos protege e que é a continuidade do nosso. Mais que nunca, é importante que o nosso lar traduza através do espaço a nossa história, que não seja algo alheio a nós e que nos resguarde de situações limite como a que atualmente vivemos. Ainda para mais, não se sabe por quanto tempo mais continuaremos nesta situação…

Com este confinamento, muitas são as perguntas que nos surgem, também, a nós arquitetos sobre as exigências das casas do futuro [próximo]. Como projetar casa onde a situação de confinamento será cada vez mais normalizada? Sim, do meu ponto de vista e pela informação que nos chega o isolamento voluntário ou obrigatório poder ser cada vez mais frequente. Assim como o teletrabalho. Ambas as situações provocarão uma mudança do desenho e das relações espaciais do espaço privado e intimo vs interior e exterior.  De forma a que as nossas vivendas sejam cada vez mais agradáveis, cómodas, seguras, saudáveis e com identidade. Encontrar a nossa identidade no espaço, não tem que ver com o facto de termos mais m², mais móveis e objetos da marca X ou Y. O espaço existente e a intervenção que podemos fazer nele com elementos de mobiliário e/ ou decoração têm que responder às nossas necessidades e ao nosso estilo de vida. Cada casa é única e “intransmissível”. Os tempos atuais requerem, mais que nunca, que sejamos minimalistas: que ponhamos de parte o importante e nos foquemos no essencial. Nós.

| Casas Versáteis e Multifuncionais |

Se anteriormente os espaços modulares já estavam a ser pensados porque as casas tinham poucos m² devido aos valores  imobiliários. Atualmente, a versatilidade, a possibilidade de transformação, a polivalência de usos em cada assoalhada é-nos exigida e temos que potenciá-la ao máximo. O teletrabalho será uma prática cada vez mais comum e se manifestará em cada casa. Uma possibilidade será adaptar zonas aparentemente desaproveitadas e transformá-las numa oficina. Estas zonas podem ser um corredor, um recanto ou um espaço difícil como o vão de escadas. Maximizar as possibilidades com o que temos é possível e não é limitador. Inclusive potencia a nossa criatividade e podemos encontrar soluções espaciais onde aparentemente não existiam. Se antes tínhamos espaços ou móveis sem uso, agora é o momento de ressignificá-los.

| Relação Interior – Exterior |

Ao longo dos anos, era comum os clientes pedirem-me para fechar as varandas e aproveitar esse espaço para a sala de estar ou para o quarto. Agora tenho a certeza que no futuro preservarão cada varanda, cada terraço, cada espaço que una o interior com o exterior. As coberturas dos edifícios deixarão de ser espaços perdidos, não habitados, para se transformarem em espaços comunitários de Liberdade, respeitando sempre (quando necessário) as medidas sociais necessárias. Estas novas exigências, provocarão um novo redesenhar das casas e das cidades. No século passado, no centro das cidades a largura das ruas ou a sua orientação não garantia horas mínimas de sol diárias. Os edifícios tinham apartamentos exteriores mas estes eram sombrios e frios. Deveríamos resgatar para cada bairro ou bloco de edifícios os espaços verdes como nos propôs Courbusier. Esta abertura de pensamento que está a surgir, para repensarmos a tipologia da casa e consequentemente da cidade, possibilitará a adoção de medidas bastante mais sustentáveis em que o carro não será mais o protagonista do centro urbano.

| Resgatar a Natureza para o interior |

Já algum tempo que se nota uma grande procura de objetos ou móveis feitos de materiais naturais, como é o caso do ratán, da teca o da cortiça. São apostas decorativas certeiras, bastante sustentáveis e que nos aproximam à natureza. Estes materiais fazem que o ambiente seja mais leve e confortável.


Sem dúvida, que atualmente o espaço doméstico é uma desafio para todos. Para mim, em particular, sempre me fascinou. Traduzir em espaço as necessididades presentes e futuras de alguém, os seus hábitos, a sua forma de habitar de forma sustentável é algo desafiante. Dar visibilidade ao “interiorismo” de cada um e motivar-lhe a que “se habite” sem medos, é o melhor quadro de “ natureza viva” que eu posso “pintar”, em cada projeto.

Antes de terminar, quero fazer um parênteses real…

As minhas reflexões são duma arquiteta, mas também de uma cidadã preocupada. Esta situação limite de pandemia, como outras, são mais agudas para quem não tem teto ou vive num campo onde a sanidade é nula, e onde um pequeno vírus torna-se num Tsunami. Exemplo disso são os Campos de Refugiados. A casa é a proteção que salva vidas e todos deveríamos ter direito a ela. Este tempo exige medias governamentais e politicas humanas urgentes, porque amanhã já pode ser tarde demais. 

Entretanto podemos todos juntos fazer a diferença.

Aqui vos deixo um link da associação Humans Before Borders que está a receber ajudas monetárias para as ONGs médicas e sanitárias que estão a trabalhar nos Campos de Refugiados nas ilhas de Lesbos e Saos na Grécia. wwwgofunde.com/f/salvavidasdecasa  

E também de Just a Change, uma associação que recupera casas de pessoas que não têm recursos e vivem em condições precárias:www.justachange.pt

Ajudemos, porque  “a Solidariedade não está de Quarentena”.